DO BOL
Em 30 de janeiro, o Brasil comemora o Dia Nacional dos Quadrinhos, arte que está ganhando força no país com o surgimento de novas opções de leitura online. A reportagem do BOL conversou com Fábio Yabu e André Diniz, quadrinistas que usam a internet como veículo de publicação, e mostra que o cenário é otimista para quem está disposto a fazer boas histórias online.
Pioneiro no Brasil
Fábio Yabu, 33 anos, se define atualmente como escritor. Ele foi um dos primeiros a apostar na web como ferramenta para publicar suas histórias em quadrinhos. Em 1998, criou o site Combo Rangers, série em quadrinhos inspirada em super-heróis japoneses e feita exclusivamente para a web. "Na época era a única opção. Eu tinha 17 anos e nenhum contato com editoras, então arrisquei no formato online e, para minha surpresa, o site foi um sucesso", conta.
Depois de quatro anos, em 2002, o Combo Rangers chegou a receber mais de 15 mil acessos por dia em uma época em que poucos brasileiros tinham internet em casa. Fábio acredita que não teria o mesmo sucesso se fosse partir para o impresso. "Fazer quadrinhos na mídia impressa não é rentável. A distribuição é complicada, envolve muitas empresas como editoras, livrarias, pontos de venda, logística, etc. Além de o mercado consumidor deste tipo ser baixo no país."
Em 2001, o Combo Rangers foi parar nas bancas pela editora Panini, mas não conseguiu manter o vigor que tinha na internet. Em 2004, as vendas nas bancas foram encerradas, e Fábio decidiu também que era hora de dar fim ao site. "Havia dificuldade na mídia online também. Naquela época o mercado na web era retraído e a publicidade não era tão abundante. Fechei o site, mas os fãs ficaram", afirma Fábio.
E os fãs que ficaram não sossegaram até conseguir que novas histórias fossem elaboradas. Em 2013, o site voltou e o quadrinista descobriu o poder do financiamento coletivo via internet. Fábio arrecadou R$ 67 mil para publicar novas histórias na mídia impressa, garantindo um retorno gratificante aos fãs do personagem, com direito a lançamento de livro na Bienal do Rio de Janeiro.
Para Fábio, foi emocionante o apoio financeiro e o suporte emocional dos fãs. "Não é fácil realizar um sonho, mas durante anos fiz boas histórias para o público e é bom saber que as pessoas leem as histórias e queriam novidade".
Fábio conta também que o site não traz retorno financeiro, mas funciona como porta de entrada para os fãs conhecerem os personagens e suas histórias, disponíveis para vendas nas livrarias e em formato digital. "Ainda não dá para sobreviver com quadrinhos online, pelo menos no meu caso, mas isso não me preocupa agora, uma vez que tenho outras atividades mais rentáveis".
Criação online
Para André Diniz, roteirista e desenhista de histórias em quadrinhos, a internet atinge um público maior e serve como uma ferramenta importante de leitura. Ele acredita que os quadrinhos chamam a atenção por sua essência. "Quadrinhos mesclam duas formas de arte para contar uma história: o desenho e a escrita, as duas com o mesmo grau de importância. Elas viraram uma coisa só."
Aos 38 anos, André produz HQs desde 1994 e já ganhou 17 prêmios por suas criações. Ele publicou no mercado impresso histórias como "7 Vidas", "Fawcett" e "Morro da Favela", e suas histórias estão presentes em bibliotecas de várias escolas públicas do Brasil. Mas ainda faltava um projeto que alcançasse um grande público, foi daí que surgiu o site Muzinga.
"O site é talvez o projeto da minha vida", afirma André, sem exagero. Ao lado da esposa, Marcela Mannheimer, ele se cansou da dinâmica do mercado de livrarias, que demora meses para publicar uma história, limitando o número de cópias e cobrando um preço nem sempre justo.
"No Muzinga, nós fazemos cada história em um ou dois dias e, assim que está pronta, ela vai ao ar. Qualquer pessoa pode lê-la na mesma hora, a custo zero. Sabemos também a opinião dos leitores sobre a história. Isso é fascinante", afirma.
Abastecido duas vezes por semana, às terças e sextas-feiras, o site publica aos leitores novas histórias e foi pensado para atingir também o público mais jovem, que usa smartphone ou tablet.
André acredita que essa aproximação com a web é vital para o mercado de quadrinhos. "Nos EUA, a produção de conteúdo online já responde a 10% das vendas de quadrinhos. Se trouxermos esse mercado ao Brasil, país de poucas livrarias, e ao mesmo tempo um dos países que mais abraçam novas tecnologias, podemos fazer uma excelente produção voltada para o digital".
Ele também se mostra otimista com a qualidade da criação brasileira. "Há uma explosão criativa dos autores como nunca houve antes, e o público e a mídia estão interessados nesse movimento. E, se por um lado fica cada vez mais difícil contar com boa parte das editoras, por outro é perfeitamente viável ao autor se autopublicar, seja no impresso ou no digital".
Mas é importante frisar que dinheiro não é algo que venha fácil quando o assunto é quadrinhos. O site de André Diniz, por exemplo, estreou recentemente e ainda não fatura com publicidade, mas serve para divulgar o trabalho do autor e torná-lo mais conhecido do publico.
"Não penso nele como a minha fonte de renda, mas como uma parte importante do meu trabalho. Se os quadrinhos online fizerem os meus livros impressos venderem mais ou criarem um público para os meus e-books, então eu vou viver também do lucro indireto que eles me proporcionarem", afirma.
HQs na web
E quem pensa em começar a divulgar suas histórias em quadrinhos pela internet deve ficar atento a alguns macetes. Primeiro, é não achar que está entrando em uma espécie de negócio. Facilita para o quadrinista acreditar mais no sentido de uma aventura, que pode ter ou não grandes resultados.
André Diniz afirma que o mais importante é ser apaixonado por quadrinhos. "O mais importante no primeiro momento é a paixão por se expressar pela linguagem dos quadrinhos e a dialogar através dela com o público. Sem essa paixão, não vale a pena nem começar. Se houver um lucro mais à frente, ele será fruto dessa paixão.", relata.
Mas não é para abusar da fantasia e deixar o profissionalismo de lado. É importante levar o meio digital a sério. "É necessário estudar os formatos que funcionam para a dinâmica da internet. Fazer pensando no papel e jogar na web por falta de opção não é um bom caminho", aponta André, que também diz que o uso tecnologia é fundamental para disseminar personagens e ficar mais popular.
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